há um inimigo estranho que se encobre sob minha pele e minhas intenções
não há pra onde fugir
quem sou eu
quem me é ele?
sigo no esconderijo silencioso da minha fata e voz
persigo rotas de treking
pra saber pra onde ir e encontrar só a mim
cordilheira do espinhaço

a solidão me espreita
engraçada de mim.
ela ri do meu desjeito,
do meu muro,
do meu ponto,
da minha falta de tato,
algema, luva, ato.
ela ri da minha óbvia e falsa
intenção de perteza.

aliso com a palma da mão
uma rusga de destino.
[um carinho nessa dobra de vida
que me guarda em algum vinco.]

divido contigo
essa triste expectativa
de mim mesma.
esperemos.

:: das polidas truculências

para a máfia das três crápulas

e as crápulas ajeitam seus cabelos ruivos,loiros,pretos e manchados de verde. andam bancando fetiches  caros pra dias de sábados. planejam acessórios e esquivas, calçando scarfuns vermelhas, comprando halls cerejas, premonindo animações várias. elas descem do salto, são rasteiras e gostam de tapetes, chet baker,
língua quente, vódegas e falsas putarias. [risadas, risadas e risadas.] vão juntas ao banheiro e quebram quaresmas, bebem cervejas, comem carne vermelha,cortam os pulsos e saem com lobisomens

mal sabem: são castas e é tarde.muito tarde.
para a máfia das três crápulas

e as crápulas ajeitam seus cabelos ruivos,loiros,pretos e manchados de verde. andam bancando fetiches  caros pra dias de sábados. planejam acessórios e esquivas, calçando scarfuns vermelhas, comprando halls cerejas, premonindo animações várias. elas descem do salto, são rasteiras e gostam de tapetes, chet baker,
língua quente, vódegas e falsas putarias. [risadas, risadas e risadas.] vão juntas ao banheiro e quebram quaresmas, bebem cervejas, comem carne vermelha,cortam os pulsos e saem com lobisomens

mal sabem: são castas.
toco com dedo pungente o pedaço mutilado que ainda sente. sinto?
suspiro o  desperdiçado, nessa armadura asfixiante.quase me ouço.
[eu vader]
morrendo por dentro sob um véu negro&rígido&brilhante
 
minha sinceridade carece de holofotes
tão perdida nas sombras que persigo
acendo uma vela e digo meu nome: [Penumbra]
pura dispersão. ônibus posto: vidro e rosto : sono e direção.
que gozo ainda persiste, em pura lembrança em riste?

insisto em escrever uma história menos triste que os restos de um carnaval
gosto da letra no papel:
caneta
alvura letra
gravura
ortodoxo não é tanto, este efêmero cais.
cansada de ais, dançando com ventos,
ela não diz bye.
fica.
sempre.
pra.

[loucura,brisa & sal]
tensões constantes na tristeza contida. leveza sustentada em ferro guarda os segredos do inútil aos olhos.
tem razão.

não terceirize essa perfumada tarefa [do lúdico ao lúcido,completo.]sobressaltos.
o que é bom sempre reverbera.
beijo meu.
:: C 

o contorno do sentido, desafio táctil e perigoso 
[abismo. vertigo. blackout]
sabe esse soluço? isso é [três pontinhos]

arrisco rupestria mestrada rumo ao nome que mata a coisa
[unknown error] falha arcaica [onomatopéia]
fala entupida, soluça, soluça!

sem alfabeto, eu hiato arrisco um plágio.
tontura e dedo indicador pelo índice onomástico.
páro na beira do c. à procura do abismo que é o palíndromo do nome dela.
te roubo, ana cristina.
treino sua caligafria, a forja. 

[efusão de palavra, aventura de registrar a fenda: desistir da fluência, todos os truques. bruta castidade /césar,ana cristina]

leio em voz alta pra ver se a letra ficou parecida.
rio do truque. leio e sigo o conselho: 
troco o plágio pelo espelho.
fico com as letras ,os rasantes e o estilo.

o resto é registro.
:: flashes amorosos #5 

as cores da madrugada
na sua carne marcada

[seu corpo guardando meus dentes]
index 

soletro indignamente teu nome
[desejo]
gaguejo arpejos de timidez
revelia de coragem
ensaio de dono
ex-pe-ri-men-ta-ção

solicito como que ordeno
[tú vens]
palavra
mágica
abracadabra é qualquer segurança dita.

[digo] 
[terminal]



[voláteis
anos andando no mato,
nunca vi um passarinho morto,
como vi um passarinho nato.
onde acabam esses vôos? dissolvem-se no ar,
na brisa, no ato? são solúveis em água ou em vinho?
quem sabe, uma doença dos olhos.
ou serão eternos os passarinhos?
paulo leminski]


pa[í]ra um pássaro


conserta a asa,
apruma o peito.
não ousa canto,
não acha quinas,
vai sem bando, sem rumos ou rimas.
do lépido ao intrépido.
numa reta sem rota, uma memória páira:
[adjacências]
panorâmica finda da vida.
última voada
[ida]
aterrisando exausto e satisfeito
[não sem dor]
o corpo morto,
não torto,
leve e confluente
de um pesar que nem mais sente.

consente:pára em repouso
um ninho sem fim.
Origami

Faço vincos,
Finco as unhas,
Lambo dobras.

Divido.
Partida, dobro-me.


[A matemática impossível da minha geometria
me projetando sob seus planos]
kirigami


recorto a fina folha
em flor orvalhada

rasgo, entalho, lagrimo

vermelha,
sangra por entre suas frestas

[não era a flor]

era a pura dor distraindo a solidão
Demitido o bom senso ficam as coisas, temporariamente, mais fáceis. Lacuna improvisada, gafe anos ensaiada, fenda de vestido bruscamente calculada entre um gesto e outro. Esse improviso, duvide baby, é manipulação. Pura experiência vestida de falsa inocência. Sou eu testando, milímetro após milímetro, a tonelada sobre seu coração. Sou eu de sempre, avulsa, escolha feita, que sai às vezes soturna pela noite, a fim de aplacar o que sobra de minha reclusão celibatária. Não se ofenda, nem a mim. Se não entende parta com essa coisa incógnita na boca, guarda segredo e uma interrogação, guarda historia pra contar a alguém meio místico, matemático, psicólogo ou simplesmente alguém meio sensível. Guarde entre os dentes, num quarto sótão, onde ficam aquelas  historias inacabadas que sobram ameaçadas e amassadas no lixo do escritor ruim, aquelas que não esperam mais desfechos. Essas que ficam por anos ou toda vida. Agora, se quiser entender. É melhor calcular bem as passadas: não ouse mais que minha própria covardia te convida. Calcule comedidamente para não perder o ponto, cara. É trabalho duro esse de driblar a minha mania de historias não escritas, sussurros, qualquer insinuada, improvisada. Eu desembolo e antiquário aquilo que você esconde no sótão. Eu coleciono.
sim, eu poderia continuar a desenhar minhas estrelas nas tuas mãos, cartografias aéreas ensaiadas em previsões tendenciosas. poderia continuar a nublar os olhos pequenos com as cores turvas que coleciono. poderia continuar a dividir contigo contrastes a nos proteger de luminescências. meus óculos, suas sombras. poderia miliuma vezes, antes de morrer, viver as histórias que a gente tanto gosta, escrevendo legendas particulares em cenas ineditamente protagonizadas. poderia continuar a marcar sua carne com as cores da minha madrugada - presença. poderia continuar a espalhar meu perfume por coisas de seu domínio, só para não deixar que você, independente e seguro, me esqueça. [som de piano, impromptu, sussurro: don´t forgive me] poderia escrever, numa gramática reconciliada, todos os tempos do mundo. inventar eras, eternos, tragédias, desastres e linhagens.
mas não é tempo ainda.

por isso, há que se guardar o amor para o apocalipse que advêm, para que entre escombros, te flertar com olhar certo e adormecer firme e concília juntando meus cabelos aos teus.

sussuro[estamos seguros]sussurro

te amo hoje, sem esperar eternidades.sendo assim, aguardemos.
vamos a um café, capuccinos e carícias em números pares.
mas não além.
::anotações sobre luz/sombra


Era pra ser doce. E eu sigo desconfiando seriamente de mim mesma e de minhas papilas gustativas, tenho problemas.Mas nem me assusto, te assusto. Queria a claridade turva de um imenso céu nublado, [branco] assim desse jeito, que é para que você se vesse.Há uma casa castanha em meus olhos. Abandonada de céu , ela segue ainda nublada. Há uma pinta na pupila que mancha de meu o resto do mundo, carimbo visual que pontua o que me asseta. Paisagem. Consegue ver isso tudo? Chega aqui perto, olha. Eu olho o seu olho. Eu bem que te disse,lembra?[eu me vejo através do que você me vê].Você ri e acha tudo embolado, meio complicado. Eu nunca fui muito simples mesmo,né. Minto, na verdade sou simples, meu problema é que sou prolixa e mentirosinha. Meu problema é gostar de palavras e gente sem palavras.E isso eu não perdoo,me denuncio - falo de estranhamentos que, alheia, acho serem só meus. Me aproprio indevidamente de sensações e esquisitices, patenteio.Tenho possessividades com essas coisas e você sabe. Quando pressinto entendimento, compreensão do que digo de mim, esquivo. Lá vai [ainda ela] correndo pelas rédeas do sentido, deixando os cabelos para trás, loiros como nunca. Na verdade eu não quero mesmo é que descubram essa armadilha de desenho animado que cavei aqui bem no fundo. Um fosso e um tapetinho bordado. Não quero que descubram esse fosso infundado, onde montei uma gangorra que arrebenta meus joelhos contra a parede úmida. Mas eu digo do fosso e nem sempre digo bem. Isso é minha intimidade, digo do frio e do escuro que é, reclamo. Acho que a casa castanha tem a ver com isso [esquivo de novo mas você me busca], digo da fauna que lá habita, digo do medo [bobo] que ás vezes sinto desses "coisinhas".Falo do fosso e da minha voz lá dentro, falo de [eus].Te conto de musguinhos e de carpetes decorativos, eu comprei [ invisto em amargurinhas].Digo também das minhas coleções, falo dos destroços, falo dos baús semi-fechados , da caixa de mármore branca, de minhas fortunas recuperadas, falo de muita coisa que guardo aqui dentro. Digo até a temperatura da coisa, eu pecilotérmica. Com você algo acontece, para além do fosso e do tapetinho,Survivorman. Você, com suas técnicas dribla minhas artimanhas e olha pra baixo. Eu deixo que chegue muito perto, percebe? Falo tudo e tanto. Eu confio e deixo você olhar ali debaixo do tapete [por mais que não deixe você entrar].

10:17hs p.m.

silêncio dos passos únicos
numa noite já finda.
um cigarro pra distração,
um vento que toca a mão
e um caminho óbvio em meio a mim.
ajeito os óculos ausentes na face:
hábito.
rio de minhas manias
e vago.
bilhete de geladeira pras horas de fome

sim.
era isso que você queria ouvir.
vamos ser óbvios já que isso tanto te agrada:
eu gosto de você-
para o humanitário que sou,
que ama todo o mundo e gosta de poucos,
isso é grande coisa, muita coisa.
gosto desde aquela época, desde sempre.
nunca foi diferente.
antes que seu ego idiota infle
-como já bem prevejo-
não vejo muita graça neste fato,
mas apesar disso há salvações.
por exemplo: o seu cheiro de xampú,
o seu hálito e os cigarros camel.
os meus acabaram,
o humor e o saco pra grandes revelações também.
vou comprar cigarros.
mas volto.
volto uma hora melhor,
mais humorado e menos abstêmico.
(me refiro a cigarros e não a sexo, babe)
beijo,
João

solicitações tardias

peço um alma sensível
e congruente

cruel,
a minha mente.


[abro minhas gavetas em meio a tempestades]
escritos borrados tem cara de acting-out
constam nos autos sinceras repetições.
onde isso vai parar?
não pára.
o processo que não pré-cessa,
não cessa de setas sem rumo.
tortas e curvas,
palíndromos-labirínticos tão sem fim.

preciso parar,trilhar e tentar novo caminho.
sigo em um camelo pelo mapa certo,
desta vez corrigido e redigido pelo google earth.
o endereço da oráculo atrás de um deserto de mim.
eu vou, percorro caminhante e pontual
por ruas ineditadas pela minha esperança.
vou em busca de sede no final.
o caminho?chove.sempre.
tão entretida está ela nesse mundo diferente. ela anda vivendo, passando pelas coisas com a certeza de um prelúdio. prelúdio de uma leitura definitiva. ela - certa do tempo que tem sobre novos domínios. ela mais simples pra si mesma, sem mistérios inventados pra confundir sua altiva pequenez. ela assimilada e corajosa frente ao álbum de retratos dos anos de coma: distâncias, apesar do colo posto; cheiros sensíveis, ainda que o cigarro; saudades, ainda que persistentemente presente. as fotografias foram para guardar o ponto [save files].as saudades não pedem pra se voltar atrás de pontes queimadas e rumos extintos.ela planeja novos mapas enquanto pára e alinha os joelhos tortos e infantis.isso é importante antes do passo.

::bricoleur 1

o mundo,quando afana minhas impressões, me assuta.o mundo que só eu de [eu] conheço.contrapontos rechaçados que me chocam em sua espontaneidade, à minha revelia.alguém cruza por mim numa rua qualquer e titubeia solitário,inventando um ritmo qualquer pra matriz tão bem conhecida por mim,alguém canta minha música.alguém reinventa os meus olhos e isto vira um retrado de uma tarde de sol,na rua tal,naquele dia e você sempre você,o mesmo sozinho e ponto.

[
hoje eu sei
que é tão fácil fazer
coisas difíceis de consertar

hoje eu sei
que é tao fácil perder
confiança

você tem o certo e o perfeito,
eu sei
eu seeeeei

paulo, você não me fale de dias mais triste
que estas coisas não tem mais lugar
sei o que eu quero e é felicidade
escrevo num livro só pra contar
que a felicidade é o seu nome

hoje eu sei [...]
]
#paulo e os livros-casino


assovios,assovios e no fundo ninguém está tão só.
desprende desse arraigado o intuitivo antigo olha o espelho quebrado ainda reflete.flerte estre estilhaços pelo retrovisor intacto. incerte.ele que inventa um baque qualquer que rodopia e perde o rumo.acredita nisso. e vive a desorientação sem sentido,pura e simples no contexto inventado por espectativas repetidamentes inutéis.olha-se.o rascunho antigo é mais verdadeiro do que esse resumo de si.fábula rasa na tábula funda.acorda.rente a retina inerte bate todas as lágrimas e luminosidades antigas e tão agora esquecidas.o olho brilha na memória e alimenta qualquer coisa distante.aproxima.[-se].dadaísmos á parte,o tempo passa.há que se fazer sentido.releia.[ponto].reescreva.reescrever é uma tarefa sempre de agora_escreve ele na folha branca.[ e ponto]

:: kali

conheci kali.é deusa ela,hindu.é estranha.tem uma língua que acorda a gente,é quente.kali dança bonito.kali namora shiva. kali lembra a mim da vontade infantil de india.kali liga os pontos depois que abre a fenda.ela vermelha mora no cinza.[amor sexo vida morte].eu disse que ela era a preferida de shiva?era.deve ser ainda,ainda mais hoje num mundo de poucos deuses.kali parece distante aqui do meu quarto ocidental.invento. atribuo a ela os cheiros prensados, o quente colorido, a língua linda pendente vermelha.ela toda guardada no mármore branco que tenho. um dia ela me guarda.
::das promessas e presentes I

prometo ser sombra para teu descanso,
ser casa pro seu cansaço,
fazer do meu peito, morno e cheio, o seu melhor regaço.
::aconjuntada

não nasci em montes claros. não tenho nome completo. Não sou professor. não consegui conciliar nada com a literatura. nunca publiquei nada. atualmente não resido em porto alegre. não me chamo eduardo veiga. não escrevo poesia há mais de 15 anos. não estou organizando meu primeiro livro. não sou graduado em letras. não acredito que a poesia seja necessária. não estou concluindo nenhum curso de pedagogia. não colaboro em nenhum suplemento literário. não estou presente em todos os movimentos culturais da minha terra. não sou membro da academia goiana de letras. não trabalho como assessor cultural da sec. meus pais não foram ligados ao cinema. não tenho tema preferido. não comecei a fazer teatro aos 12 anos. não me especializei em literatura hispano-americana. não tenho crônicas publicadas n'o republica de lisboa. não passei minha infância em pindamonhangaba. não canto a esperança. não recebi nenhuma premiação em concurso de prosa e poesia. não tenho sete livros inéditos. não sou considerado um dos maiores poetas brasileiros. nunca fui convidado para dar palestras em universidades. não vejo poesia em tudo. não faço parte do grupo noigrandes. não me interesso por literatura infantil. não sou casado com o poeta afonso ávila. na minha estréia não recebi o prêmio estadual de poesia. o crítico josé batista nunca disse nada a meu respeito. não sofri influência de bilac. não sou ativo, nem dinâmico. não me dedico com afinco à pecuária. não sou portador de vasto curriculum. não recebi mensão honrosa no concurso de poesia ferreira gullar. não exerço nenhuma atividade docente, nem decente. não iniciei minha carreira literária no exército. não fui a primeira mulher eleita para a academia acreana de letras. não tenho poesias traduzidas para o francês. não estou incluído numa antologia a ser publicada no méxico. minha poesia não é corajosa. não gosto de arqueologia. walmir ayalla nunca me considerou um revolucionário. nunca tentei compreender o homem na sua totalidade. não vim para o brasil com 5 anos de idade. não aprendi russo para ler maiakowski. meu pai não é chileno. não sou virgem, sou capricórnio. não sou mãe de seis filhos. nunca escrevi contos. não me responsabilizo pelos poemas que assino. não sou irônico. não considero drummond o maior poeta da língua portuguesa. não gosto de andar de bicicleta. não sou chato. não sei em que ano aconteceu a semana de 22. não imito ninguém. não gosto de rock. não sou primo dos irmãos campos. não sou nem quero ser crítico literário. nunca me elogiaram. nunca me acusaram de plágio. não te amo mais. minha poesia nunca veiculou nada. não sei o que vocês querem de mim. não espero publicar nenhum romance. não sou lírico. não tenho fogo. não escrevi isto que vocês estão lendo.[foi o nicolas behr]
:: sina

nocivo
permissivo
abrasivo
corrosivo
ninguém que te ama
escapa do teu crivo
:: excerto de ana

[O tempo fecha.Sou fiel aos acontecimentos biográficos.Mais do que fiel, oh, tão presa! Esses mosquitos que não largam! Minhas saudades ensurdecidas por cigarras! O que faço aqui no campo declamando aos metros versos longos e sentidos?Ah que estou sentida e portuguesa, e agora não sou mais, veja, não sou mais severa e ríspida: agora sou profissional]

#ana cristina césar-a teus pés
mostro os dentes
passo rente
mordo a língua
vivo á mingua
cuspo sangue
bang-bang

poeira nos olhos
mas eu em pé

[cuspida]
:: birdinsight

meninapássaro rosto gralha
rápida no rapto de palavrascertas
por fim canta, rindo gentil.
:: 1931 1980 2007

"[..]não sirvo para ir mais longe, tentar qualquer dos caminhos que outros seguem à procura de seus mortos, a fé ou os cogumelos ou as metafísicas. sei que você não está morto, que as mesas de três pés são inúteis; não consultarei videntes porque eles também têm seus códigos, olhariam para mim como um louco. só posso acreditar naquilo que sei, continuar por minha calçada como você pela sua, diminuído e doente aí onde você está, sem me incomodar, sem me pedir nada mas apoiando-se de alguma forma em mim que sei que você está vivo, nesse elo que o enlaça a essa zona à qual você não pertence mas que o sustenta sei lá por quê, sei lá para quê."

[júlio cortázar- octaedro]
::sobre ele [para ele]

olhares piscados, línguas secretas, rabiscos em alemão para contornar o que se sente. inédito enquadre, intuito. eu digo, ele diz. desde a primeira vez eu o quis, hoje muito mais.

moro agora neste lugar preferido, um descampado em pele branca marcado de pintas- alvos- meus. e grande é ele, fazendo que eu levante meu pescoço para ganhar altura quando estamos abraçados. e ele abraça como quem circunscreve, eu ponto, me centra. me carrega nos ombros, em lúdica segurança declarada, eu rio.

deitada ao seu lado eu driblo a escuridão e desenho em percurso cada movimento dele, respiração de sono colada á minha pele- travesseiro. ele grande justo e certo no meu colo.

ele muito menino, muito homem, muito meu, muito dono.

ás vezes ele é sério, firme como suas observâncias silenciosas. traz aí o que me pesca: olhos profundos que me contam do que sinto, olhos seus que empoeirados de sono, me cercam de manhã e quando acesos á noite, me despertam de breu.

gosto da sua preguiça que me envolve em mimos e sonolência, da sua animação que me faz rir de danças fofas e cócegas inesperadas, achando qualquer alegria destas, inédito acontecimento. gosto também do jeito como aprende, como ensina e como conta coisas: detalhes encaixados na boca fofa, proprietária de toda palavra nascente.

e me ganha, me conquista no que diz e ele me diz de tanto, me diz de céu, de placas tectônicas, de teorias filosóficas, de coisas engraçadas, de bebedeiras, de infância fofa sua e adolescência rebelde, da saudade que sente por mim em noite distante, me diz de meus defeitos com respeito, do quanto gosta de limão, de bandas que teve, de bandas que gosta, de filmes que viu e que carinhosamente insiste com a minha preguiça para que eu os veja, me diz de ácaros e de gatos, do seu medo[ receio, medinho] de pit-bull me diz de faunas, floras , guiness, me diz dos carinhos meus que gosta, da sua insatisfação com camisas largas, de estrelas e buracos negros, da diferença de “maior que o mundo” e “maior que o universo”, de falhas meteorológicas, de aspirações profissionais, me diz da minha desorganização, achando mais fofo do que repreensível, me diz de seus medos, de seus feitos corajosos, de suas lembranças ternas, de seus planos esperançosos, de mim nos seus planos esperançosos, do medo infantil da medusa, do filme nosso e de todas as semelhanças, da sua preferência pelo meu cabelo grande, me diz que eu não posso passar maionese com a mesma faca que se corta o pão, de seus pensamentos engraçados- mau- humorados, me diz da sua vontade de ter uma moto e me levar na garupa, da sua teoria sobre gatos e murphy, me diz de atlântida, de mitologia grega e do que sente por mim, me diz de histórias da família e de como fazer um churrasco foda, me diz “pertinente” “shopping” “Gmail” “niedlich” com a boca mais linda do mundo ; e me diz de palavras que eu nunca ouvi, e me impele a dizer o que nunca disse.

ele me apaixona como se pela primeira vez , sempre que ponho meus olhos e ouvidos nas suas aparições todas; ele me surpreende, me assusta de alegrias e felicidades agora tão habituais; ele eu escolho como último namorado e que idem me aceita; ele me imprime, a cada olhar que lança certeiro, uma vontade grande de abraçar do meu jeito e de dizer no seu ouvido: “niedlich, hgasywe sadew dfwejuywebvf” . ele, que me faz ter vontade de sapatear na sua frente, eu amo.



pelo caminho de volta colecionava na bolsa luzidas-percursas, gosto seco, gasto neon. ele e seu passatempo habitual, voltar pra casa. daqui de cima,há um tempo atrás, ele olhava os carros lá em baixo e pensava naquela música, a sua preferida:

"two blue lights/
there's a dead archer in the tower you can't hear it but you can tell" .

de morto não via ninguém, via apenas a possibilidade de vôo e os desatinoscaminhosvelozes abaixo de seus pés, ali na passarela do metrô. sozinho, derrotado pela rotina-opressa, suado pela testa e pelas insistências, sorria o último sorriso limpo e inédito como todas as suas felicidades. seguia na velocidade atrasada, que perdia em cheio para a dos refllexos impressos na retina sua. era simples quando assim. era um. era todo e se tudo houvesse, tudo. guardava essa certeza nos ouvidos vedados, fone insone onírico acorde.
seguia no noturno conduto, prestes a adormecer iluminado em qualquer escuridão. eu disse qualquer.


::songs: ohia # [two blue lights]



:: das caixas III

a decadência consiste em guardar numa caixa qualquer, histórias recentes epidemiadas de um mofo impertinente que amarela finais&óh&felizes tão antes possíveis. guardar esta caixa vira ocupação ressentida de toda uma vida, para que não se invente outros finais ou personagens que escrevem melhor que você uma boa história.

uma sala repleta de ampuletas de areia turva, ampuletas do tamanho da minha unha que roo constamente, alimentando a ansiedade e o medo de poder o que eu queria.trago garras no estômago que se alimentam de mim mesma.


definho.
torpe é a noite que me toma em desanestesias . olhar digno sobre mim e minhas importâncias me perguntam: percebe?
- se?
titubeio, cerro os olhos em profunda consideração. confusão. é difícil dizer de onde se fala, ainda que sempre noturnamente de um quinto andar que me eleva em submissões várias. térrea e horizontal numa cama escura ,de onde vejo minhas estrelas a desabar antes da supernova, eu durmo submersa donde subversões perveseiam- se em hibernações minhas. sim. quando? é a pergunta que me toma, que eu me dou, que eu laço e me lanço como num encontro. quando é que se dá a verdade de mim mesma? blá, blá, blá diurno não me esquiva de mim. não espero mais telefonemas meu, ainda que guarde, distraidamente, meu próprio número na agenda. tento o desvício de dependências tais, as mesmas do "não-mais". não escolho, mas não por falta de vontade. verdade. coleciono então atada, desejos que se acumulam e bonificam. um dia eu troco e deixo troco pra uma vida que anda me pagando mal, turvando meus olhos e enganando meu tato.
10:17hs p.m.

silêncio dos passos únicos
numa noite já finda.
um cigarro pra distração,
um vento que toca a mão
e um caminho óbvio em meio a mim.
ajeito os óculos ausentes na face:
hábito.
rio de minhas manias
e vago.
[ Próximo a nós estava um condenado com as entranhas à vista, rasgado do nariz à garganta e com os intestinos pendurados entre as pernas]

Sentada assim, na cama do hospital, pouco lhe chegava. Obnulada ela ouvia em ausência plena o falatório histérico daqueles consangüíneos. Falavam amedrontados de métodos menos agressivos, pólipos, estadiamentos, choros, velas e anastomoses. Ela ali, impassível, a ler livros modestos e histórias pouco alegrinhas. Hoje guardava o pouco cabelo numa faixa roxa que laçava sua cabeça como uma atadura de guerra, ainda tinha senso de humor ainda que levemente oniausente. Folheava o livro molhando a ponta dos dedos magros de onde o anel insistia em não enrodear. Lia, lia enquanto a mãe poluía o quarto com frutas fora da estação [as preferidas dela] e com carinhos em alegorias várias. Não por compreensão ou por bondade, mas por sem vontade permitia os abusos alheios. Permitiu até o espelho, onde a apresentaram para o espectro. O espectro.

Cabeça quase nua, olhos esgueirados pelo fundo do crânio, alvo, calvo e magro. O espelho de expressão ausente lhe sussurrava atormentado:

[- Vês, tu, como eu me maltrato? Vês como Maomé e Ali estão desfeitos, gemendo, e todos esses semeadores de discórdias e heresias? Todos aqui são continuamente rasgados, cruelmente, por um diabo que aqui nos tortura eternamente. Em vão saram as feridas, pois logo ele volta e nos dilacera outra vez! E tu, quem és, tentando retardar a tua pena aí sobre a ponte?]


Delíria. A flor morta ao lado da cama sussura palavras de um livro velho.Ela, convalecida, firme na trajetória costurada em linhas brancas, riu: boca pálida e dentes secos, sem saliva. Pouco importa. Não desse mundo ela só havia ganhado o tempo, solicitado em ofício branco e timbrado, punição. Juíza de si não sustentava a morte pura e clara. Não podia ser simples assim. Guardava no corpo algumas recordações que contradiziam aquela asséptica falta de história - pulso aberto, desperto em vermelho vivo, só serviu como marca de rebeldia intolerante. O caso era mais sério, sabia. Abriu-se com consentimento oficial. Dissecada em vida exposta se dava á observação calma e dedicada de suas mazelas e alegrias. Quantas cores tinha por dentro? Lembrava-se com distância quase científica de arrepios na nuca, de face quente, de corações em disparates, de hiatos na fala embargada, de gargalhadas, lembrava do caderno velho, hoje no fim de seu guarda-roupas abandonado, onde na última página, escrito estava: .

Lembrava avaliando honestidade, a fim de extrema-unções pessoais. Sentia cada vez menos e convertia tudo antes cor agora em rígidas letras de hospitais. Passava pela sua cabeça agora o mundo lá fora sem ela, sem seu vago e translúcido vulto. Quando pequena imaginava que não havia mundo, para além de sua pequena e frágil presença, atlas que era em ombros. Hoje sabia bem, vagava sem muita pertinência, sem muitos desejos, nem urgências. Lidava com eternidades e com fatalismos tão típicos de sua condição.[ainda sobre a ponte, porém certa do caminho]. Agora porém chorava baixinho, ali no canto do quarto, escuro como o medo que sentia. Redimida e decepcionada riu com boca salgada do relógio na parede, do livro pela metade e dessas flores com esperançosas dedicatórias. Riu com dor sabida. Saudou a inevitável visita noturna. Respondendo á pergunta do espelho, da flor morta, ela própria, atônita, relembrou enquanto despedia-se entre os dedos:


[- Nem morte ainda o alcançou, nem culpa ordena que ele sofra aqui - respondeu Virgílio -, mas para que ele possa ter esta experiência, eu, que estou morto, devo guiá-lo por todo este inferno de giro em giro. Isto é tão verdadeiro como a minha presença aqui.

Quando ouviram essas palavras, mais de cem almas se aproximaram para me ver, quase esquecendo por um momento o seu intenso sofrimento.]




[ Divina Comédia, Canto XXVIII]
palmas.duas da tarde.vim aqui trocar dois ou três rancores por notícias suas. minha passionalidade pelo caminho certo e distante de suas idéias. mapa. verde. úmida flora. chuvas e sóis. sento nesse bar infécto tomando essa coca cola e choro. te ligo a cobrar,te ligo pra me buscar. desisto no segundo toque e atravesso a rua sem pressa e sem pagar. pego um táxi e vago por puro abandono e desconhecimento. a exemplo dela[ ] eu também canto o motorista na sutileza embaraçante, enquanto fumo essa porcaria que comprei. a fé eu não driblo, cedo numa esperança desconcertada.aqui não há tantos ângulos quanto imaginei. seus olhos míopes são mesmo assim tão importantes? uma pausa desta na vida, para congelar em fotografias esse fim de mundo? queria ter pesado mais que essa fauna e flora insípida. divago nessas coisas enquanto lembro e rodo anônima por este instante ponto surdo no mundo. lembro da lente ,lembro de outros olhos, menos caros e mais fora de foco. páro sem muito porquê e caminho a pé me perguntando sobre a minha presença: que que eu tô fazendo aqui?

vim ser objetiva, vim atrás desse flash de memória boba, que ainda enche meu saco em algum lugar que não concebo bem. racionalmente - você diria. racionalmente marco um encontro ás oito, chego ás sete, tomo dois uísques pra ficar com aquela cara. gravo em câmera lenta cada movimento desde o início seu por aquela porta inédita de bodega provinciana. fixo som/movimento,som/movimento,som/movimento, sincronizo, ponho legendas e elaboro esse fim protelado, arremessado kilometricamente para um cafundó tropical. quero gravar bem esse momento para preparar lutos e afins, quero te tirar de trás da camera e te pedir um close, destes que carregam na pupila fazendo parecer que ainda há vida. e é isso,meu querido. a gente só precisa disso, pede pro garçon ali tirar, não pergunte muito, faça o que eu tô pedindo, que perigo há, e sorria. fala xis, fala puta que pariu, fala eu te amo ou qualquer dessas bobagens que são passíveis de você, tão covarde escondido aqui atrás de floresta, distância e tempo.dá a mão.plãff.era isso.vim buscar essa foto para meu álbum de ano-velho. faz quantos anos?
[ensaio para saltos I]


[Os gatos jamais me dêem a sensação
à toa
de ter adormecido antes do perigo
onde há carne, e líquido, e suor lento

engolindo a vontade da Palavra.
Que culpa tenho deste sono que se origina
antes de mim,
na dúvida de saber que sorriso fez

Os gatos de músculo me atentando
me querendo sem roupas e ao frio
dos telhados

escrevendo as coisas felinas confundidas
e seus pulos imitando sem desenho
"onde a loucura dorme inteira e sem lacunas".
]


anac.
ossos quebrados
do parto recente
depois do choro,
a gargalhada.

e gargalhou.
:: apontamentos e rascunhos

Não faz muito tempo, procurando um termo no dicionário, encontrei uma palavra que resume meu modo de ser [...]: 'ambissinistro', canhoto das duas mãos.[joe gould]
::entre mamonas e naylons

numa tarde de sol sem bengalas a torturar uma rua calçada, um menino sozinho, um estilingue, um gato e um revolverzinho vermelho e prata. um menino ainda sozinho. uma concentração agachada de quem aprendendo está a inventar outros que caibam, a principio numa vida inteira (nem que esta vida inteira padeça de vinte minutos apenas antes da mãe gritar um banho & bang-bang). o gato o esquece, não tem jeito. o estilingue apetece inércia de uma existência corrompida - e o menino o entende. um tiro e a surdez impactante do impulso. sonoplastias infantis convulsas percorrem as lembranças de dedos empunhados. a solidão e um corpo a distrair o tempo, gritar no ouvido dele e esconder até que aquele, cansado, se mande. eu mandava. mandava num mundo meu e em qualquer extensão que neste ousasse. aprendi cedo a mandar pra puta-que-pariu, encaminhava a ela vários e vários recônditos desagravos que amarguravam minha, até então, infância. apesar dos angustiantes segundos arrastados, que não me deixavam crescer, sofria-se em perder tempo com vazios intangíveis. aprendi cedo a descartar o que, com certeza, não me servia. [ainda não aprendi a ter certeza.] a mim é fácil o descolar-se de. : decolar ecos que só se repetem se eu gritar primeiro, como no quarto vazio dela - o surdo quarto de uma avó que lia lábios e de paredes que tinha ouvidos, imitavam-me. ela sorria e eu cerrava olhos como quem se esforça pra aprender a repetir, mas era sorriso. eu a repito. sem tentativas de. colo infâncias descascadas em meus dias hostis, colo cheiros de fruta, guarda roupas mistérios, colo os dias nublados, meu olhar enuviado e a lucidez que eu me postava, quando tempestades se encostavam em minha montanha. imito-me já que aquela lucidez nunca entendi, já que depois de mim nunca mais me alcancei. a mesma lucidez desse menino que inventa metáforas pro resto de uma vida, enquanto rabisca com gravetos um chão de areia e posta um revolverzinho no short de naylon. aprendi, como ele agora, a sonhar e a me defender do quê. "pra quê?"- me pergunto colocada de mim, enquando ando a me perder em revoadas memórias.uma esquina e eu me percebo sem meu revolverzinho."em que chão rabiscado eu o deixei?"
::último close com dedicatória atrás da foto

[então,que seja doce.
repito todas as manhãs,ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim, que seja doce.

quando há sol e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo, repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante.

mas,se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder.tudo é tão vago como se fosse nada]


caio fernado abreu
caminhando calados.
horas de tréguas,
punhais afiados.
oscilam por léguas,
inimigos ou aliados?

::anotações #17



Desejo, desejo, desejo. Afinal, o que é o desejo? Para precisá-lo é necessária uma clara,observe bem, uma clara distinção entre necessidade, demanda e desejo. O que se diz [necessidade] o fato biológico,diz respeito ao corpo, como a necessidade de comida, ar ou água. É animal, instintual e tem sempre um objeto que a satisfaz. Já a [demanda] pede por um objeto específico,como por exemplo a demanda de amor, ajuda ou reconhecimento e é sempre dirigida a um outro, já que o mundo instaura que o homem tenha que demandar a seu semelhante para sobreviver.Se na [demanda], o sujeito se remete ao outro e pede [me dá isso], o [desejo] se configura como uma busca autônoma [eu quero isso]. Nesse sentido a realização da demanda depende do outro,enquanto o desenvolvimento do desejo [o querer] depende fundamentalmente de mim.



::desejar é inevitável,a realização é concorrente.isso sim.


quito dívidas passadas com presentes silenciosos. tenho pés de plumas quando preciso ousar batidas íngremes, percebe? tenho vigas firmes nas sensibilidades ressentidas, mas nem mais choro.

eu que semana passada aprendi a gostar de rímel.não, não é escapismo como dizem, é um olho alongado enfeitando um calo de vida. pra minhas amarguras, essas aí, adoço vozes. eu amarga que não falo mais "argh". falo "eca" a morrer de rir.

pra viver então, não há outro jeito: o meu escárnio se revelando sorrateiramente,
na minha aparência frágil e inocente. sou caçador em pele de cordeiro, mas tenho um lobo- star no meu espelho [autografado].

eu foda. aprendi a gostar de rímel. e de mim.

hora nula

um ciclo fechado,
uma dor, um nada,
um descanso na estrada.
e ela só, a esquerda de si,
insignificando-se,
á direita monetarizando- se.
mendiga com realeza própria-
um destino é seu mapa;
guarda o que sabe de tudo,
mas sequer se personifica;
conhece o atlas de sorrisos,
mas escolheu por escárnio a gargalhada
e assim, vendida em sua suposta pobreza,
ela paga o preço da escolha.
ainda que encolha por trás de vírgulas,
que extenda suas cartas na mesa,
ainda que precipitada á beira de um abismo,
ela calce o desânimo com o próximo passo.
"á partir daqui" como O Louco- a carta escolhida,
invertida a ela no velho baralho de Marselha
-supera o luto e pontua o infinito.
começar do zero é finitar.
::sábado-quarto-escuro


[quero te explicar isso,
te passar este quarto imóvel
com tudo dentro e nenhuma cidade fora
com redes de parentela.
aqui tenho maquininhas de me distrair,
tv de cabeceira, fitas magnéticas,
cartões postais, cadernos de tamanhos variados,
alicate de unhas, dois pirex e outras mais.
não tem nada lá fora e minha cabeça fala sozinha,
assim,com movimento pendular de aparecer e desaparecer.
guarde bem este quarto parado, com maquininhas,
cabeça e pêndulo no coração.
fiz uma penteadeira com bogart e bacall,très chic.
pronto, acabei esse assunto de quartinho cultural,
mas guarde bem-para mais tarde.
fica contando ponto.]


ana cristina césar

::masmorra #vs.25

eu turvo,
algo treva.
eu rondo sombras,
sobras,
celas.
sondo as velas.
escura a especular o claro
de forma íntima,
imersa,
inversa,
aversa a estrelas.

[estão caindo sobre mim cacos sem peso
porque retorno em queda sobre os braços.
volto ao espaço circunscrito,
mas me teme meu corpo lento e bioquímico no escuro,
e lentamente sei que me dissolvo aos quinze miligramas,
seca em queda de paralisia quantificável.

ana cristina césar***inéditos e dispersos]



::letargia

a possibilidade de me quebrar eu
corto
mil-noites-inferno por um dia só eu
troco
alheios olhos sãos e assépticos eu
choco
num espasmo agudo e perdido que
solto
perdida,etérea com olhar gelado nem
noto
me belisca,me assusta,minha cara eu
topo
amoleço essas minhas dormências num
copo
alucino sem sonhos, nem sono me
dopo
meu corpo absorto, desabitado
entorto
o que já não dói, mas ainda arde eu
sopro
e fecho os olhos me esperando voltar


não volto.


:: flashes amorosos #5

as cores da madrugada
na sua carne marcada

[seu corpo guardando meus dentes]
[deve ocorrer em breve
uma brisa que leve
um jeito de chuva
à ultima branca de neve

paulo leminski]




querido,

algo estranho acontece por aqui.
você não acreditaria se não fosse eu a te contar: neva.
sim, neve mesmo, foquinhos frios e branquinhos
como sorvete de algodão [imagino que seja].
estamos assustados,
metereologistas e astrólogos contemporizam,
místicos e visionários arautam desgraças,
temores , fins-de-mundos.
não há flora nem fauna sustentável,
nem sóis e luas,
só um tempo cinza
e constantemente hipotérmico .
mas eu guardo uma felicidade inconfessa,
é tudo tão bonito.
é como se eu não tivesse mais sozinha,
é como se eu fosse tempo,
é como se eu me estendesse ao mundo,
é como se eu doesse menos,entende?[eu sei que sim]
a virtude disso tudo é que falta-se muito no frio
para se ter sentimentos extremamente passionais:
estou adormecida e segura aqui,
respeitando, de janelas fechadas,
a delicada ecologia de meus delírios.

[ouvindo o piano]

quem sabe você aparece, há tempo.
escrevo na semana que vem.

beijo.





[uma consideração,um epitáfio-prefácio]
::procrastinações tanatológicas

tem dias que pedem morte.
eu morta peço dias.
só alguns dias
pra decidir uma tal eternidade.

hades dorme
e eu me deixo ás erínias.


para a máfia das três crápulas

e as crápulas ajeitam seus cabelos ruivos,loiros,pretos e manchados de verde. andam bancando fetiches  caros pra dias de sábados. planejam acessórios e esquivas, calçando scarfuns vermelhas, comprando halls cerejas, premonindo animações várias. elas descem do salto, são rasteiras e gostam de tapetes, chet baker,
língua quente, vódegas e falsas putarias. [risadas, risadas e risadas.] vão juntas ao banheiro e quebram quaresmas, bebem cervejas, comem carne vermelha,cortam os pulsos e saem com lobisomens

mal sabem: são castas e é tarde.muito tarde.


tão entretida está ela nesse mundo diferente. ela anda vivendo, passando pelas coisas com a certeza de um prelúdio. prelúdio de uma leitura definitiva. ela - certa do tempo que tem sobre novos domínios. ela mais simples pra si mesma, sem mistérios inventados pra confundir sua altiva pequenez. ela assimilada e corajosa frente ao álbum de retratos dos anos de coma: distâncias, apesar do colo posto; cheiros sensíveis, ainda que o cigarro; saudades, ainda que persistentemente presente. as fotografias foram para guardar o ponto [save files].as saudades não pedem pra se voltar atrás de pontes queimadas e rumos extintos.ela planeja novos mapas enquanto pára e alinha os joelhos tortos e infantis.isso é importante antes do passo.
::bilhete de cabeceira

não pude te esperar acordar por que já sei como é.
tem café na cozinha, forte, do meu jeito.

[rastros meus pela sua casa,risos]

hoje se der te ligo, fique á vontade também para tanto.
não pense em mal-estares, sabemos de tudo.
a grande verdade é que já tivemos muito mais saídas.
isso antes.
hoje, colecionamos velhos mapas.

[ao menos os velhos mapas levam a lugares que gostamos, seguros,
ainda que irritavelmente conhecidos.]

beijo com amor,
L.

*ps:suas paisagens continuam bonitas.
::anotações para nanci

ela tem vincos bem fundos onde me acolho céu e durmo
colos , joelhos, abraços, ombros encaixe,
coração largo e espaçoso onde eu posso folgada
eu tenho em mim todo amor que ela me deu
e dos carinhos todos não há um que se perdeu
guardo beijos na mão bem fechada pra quando eu tiver medo
guardo abraços no vento pra quando ela não puder
guardo historias infindas para quando eu não dormir
guardo saudades tão grandes que abonam todas as mágoas
guardo as risadas mais lindas, o amor mais puro, o olhar mais meu
guardo minha mãe no melhor lugar que ela me deu.
distâncias

tenho a cabeça no lugar
e o coração há um polegar
cajado

[sinto muito pelo susto]
lá fui eu

regresso com dádivas várias
e uma mancha no coração

as dádivas eu divido
a coragem não.
nirvana

mando o mundo ás favas.
hoje me importa ter:
dois gatos,
uma janela com braçadeira,
mil-pôr-do-sóis,
todos os livros de vinícius,
a coletânea dos mutantes,
um jardim,
um quintal,
uma horta
e a tua aorta.

ao flerte antigo,antes amante,agora amigo
anotações incompletas

[
rádio ligado
troco estações porque
não sei o som que você
pode odiar

no supermercado
eu tento escolher
o mesmo sabor que você
deve gostar

se é que conheço você
só de te observar
posso apostar que não vai
me decepcionar

mais que anormal
eu devo ser
pra ver você
em todo lugar

[[pato fu]]

]

pop e raras [pode.] são certas histórias:
suspiros, sons de cravo
e um bom dia.
teologias rabiscadas

pra chris deus diz: eu existo
enquanto a noite dorme,
esquecida de amanhecer suas palpébras,
ele acorda enorme
gangorrando em móbiles luzidas:
sirius, mirgel, gacruz, albedaran.

despenca assim, mole e fofo,
ele nas minhas premeditadas nuvens.
eu deixo pulos com as caras tais,
espelho de suas estrelas,
dois olhos a mais.

constelações invento, limpo o céu com vento.
assopro.
em mim, ele estrela completa:
seus olhos em zodiacal traçado de um destino.
eu vivo.
com ele.
anotações incompletas

inventos histórias
memórias
te lembro até do que nem vi
ouvi, vivi, senti

te amo fácil
impáfido sentimento
te quero intácto.
alento.
sobre o samba

o samba é feito de letra encarnada
de alma lavada
de dor estancada

um samba é a ultima lágrima pendente
é o ir á forra com a esperança crescente

é sacudir a inércia do amor perdido
desperdiçar incauto o riso contido

o samba é sempre a alegria de amanhã







samba-canção

ana cristina césar

tantos poemas que perdi.
tantos que ouvi, de graça,
pelo telefone – taí,
eu fiz tudo pra você gostar,
fui mulher vulgar,
meia-bruxa, meia-fera,
risinho modernista
arranhando na garganta,
malandra, bicha,
bem viada, vândala,
talvez maquiavélica,
e um dia emburrei-me,
vali-me de mesuras
(era uma estratégia),
fiz comércio, avara,
e um dia emburrei-me,
embora um pouco burra,
porque inteligente me punha
logo rubra, ou ao contrário, cara
pálida que desconhece
o próprio cor-de-rosa,
e tantas fiz, talvez
querendo a glória, a outra
cena à luz de spots,
talvez apenas teu carinho,
mas tantas, tantas fiz.


"Gosto de dizer que tenho um dragão que mora comigo, embora não seja verdade. Como eu dizia, um dragão jamais pertence a nem mora com alguém. seja uma pessoa banal igual a mim, seja um unicórnio, salamandra, elfo, sereia ou ogro. Eles não dividem seus hábitos. Nonguém é capaz de compreender um dragão. Que poderia compreender, por exemplo, que logo ao despertar (e isso pode acontecer em qualquer horário, já que o dia e a noite deles acontecem para dentro) sempre batem a cauda três vezes, como se estivessem furiosos, soltando fogo pelas ventas e carbonizando qualquer coisa próxima num raio de mais de cinco metros? Hoje, pondero: talvez seja a sua maneira desajeitada de dizer: que seja doce." [caio fernado abreu]




o meu dragão não dorme nunca
quando eu atenciosa me atraio
ele fecha os olhos e finge

o meu dragão me comeu
incompreensivo: tostou percepções
me condenando a vigílias constantes

o meu dragão me psicotiza em cobranças
exigências e manhas quentes
me presenteia sorrateiro com olhos móbiles
a distrair minhas outras ocupações

mas o meu dragão é inocente
de olhos abertos e respiração fenecente
espera infantil pelas borboletas

o meu dragão eu entendo
nada adianta
o meu dragão no escuro chora, incongruente,
medroso de claridades
e da solidão a qual as vezes me abandono



o meu dragão, num átimo-ato-falho
não mais entendo
sinto em rasteiras verbais

o meu dragão sou eu


a menina que conheceu odete
sabe do lúdico e do destino
de almas passadas, penadas, lavadas
sabe do cheiro das madrugadas,
da voz de pássaros, de gatos intactos.
[silêncios]
sabe do dengo e da ralha,
da língua que lambe e talha,
sabe esconder espelhos em dias de trovão,
sabe inventar cantigas para o coração,
[larituna larilá]
sabe resmungos e palavrão,
sabe podar rosas no jardim
sabe que galinha é de comer, tem meio e fim.
sabe o tamanho de uma mulher
e a largura das meninas estiradas entre terra e céu,
sabe acompanhar novela, ler livros de faroeste,
roubar na palavra cruzada,
sabe que libélula é formiga alada.
sabe chorar e dar gargalhada,
de silêncios e de falazada.
sabe o peso do coração, sabe de sins e de nãos.
sabe calar o que não entende,
da lágrima que por um fio pende,
sabe mundos, fundos,compreende.


essa menina de avó
na garganta tem um nó.


observâncias de melhores olhos
deitados, horizontais sobre planos altos
daqui distante vejo seus relevos
tomos azuis nas mãos que nunca toquei
daqui vejo poros, ensejos
segredos que ainda não sei
vejo curvas de [esses]
sotaque que não alcancei
vejo belo horizonte

que encontarei um dia numa cidade tendenciosa
onde há ladeiras que só não me cansam mais que essa saudade
bilhete de reivindicação

esqueci minha boca nas tuas agressões,
nestes dias últimos não tenho mordido ninguém.
sabe o que há?ahn?ahn?
sabe do drama,da trama,meu bem?
por isso peço de volta minha boca com todos os adicionais:
sangue nos dentes, saliva seca, hálito de gozo,
batom prenssado, sussurros qualquer.

e não se ofenda tanto, boca nervosa é péssima tranca.
devolva.
e não se anime.

ana c. escreveu e eu te repito
"pensando em você não é bem o termo"


fígado

eu sou abutre
ou bêbada?


mostro os dentes
passo rente
mordo a língua
vivo á mingua
cuspo sangue
bang-bang

poeira nos olhos
mas eu em pé


[cuspida]



de bêbada
bebo o que não sou eu
meu gosto meu tato
um eu em mim esqueceu
insisto lascivo
aquilo que não é meu
despisto esqueço
aquilo que me esqueceu
vomito desperto
aquilo que em mim doeu
acordo rejeito
mais um dia masmorra nasceu




inscrições no café da manhã

desato seus olhos
te amanheço
com um beijo e meu mundo


verborrágica

angústia dissimulada
falafalafalafalafalafala

qualquer escuta é uma disputa
entre a dor e o silêncio

sou homem sozinho no templo.
minha falta de fé,
eu aguento.
eu sou uma música triste tocada num sábado de sol pela manhã

ouso batom rosa e punhos fechados. pouco sei de mim: femina felina tosca porca parda rubra quase morta,
abro breu ao fim da noite. eu, que com estrelas empunhadas nos dedos, astrologizo saídas táteis nos  efêmeros corpos circundantes. em um copo docedose de bobbagem horrorizo-me. meus cabelos conhaque a cheirar cigarro, minha lingua mordida, meu medo no bolso,ouço. 
ajeito a máscara e dançodançodanço danço dançodanço.
descabelada, derramada, perco brilho inebriada:  estrelas pelo chão, dedos nublados, os olhos borrados. 
na frente do espelho só sei de uma coisa: debaixo disso há mais que isso.
saudade em riste
lembrança insiste
fui dizer seu nome
tive um chiste




adormeço no altar
que eu fiz para
um deus meu
que nunca veio.


rezo pra mim.



pobre é tua alma
alva

rica é minha palma
malva

espalmei o mundo todo
cromática
aprendi delicadezas


amplexos-lunares




e ele tem um abraço tão forte,
mas tão forte,
que sempre me deixa mais apertada
que são jorge em lua minguante




terceirizados

o bicho come
a fome
quando
eu o como
quito dívidas passadas com presentes silenciosos.
tenho pés de plumas
quando preciso ousar batidas íngremes,
percebe?
tenho vigas firmes
nas sensibilidades ressentidas,
mas nem mais choro.
eu que aprendi a gostar de rímel.
não,não é escapismo,
é um olho alongado enfeitando um calo de vida.
pra minhas amarguras,
essas aí,
adoço vozes.
eu amarga que não falo "argh".
falo "eca" a morrer de rir.
eu assim,
que descubro diariamente pintas e estrelas,
enquanto enterro,
persistentemente,
meus mortos vivos.
não há outro jeito:
o meu escárnio se revela sorrateiramente,
na aparência frágil e inocente.
sou caçador em pele de cordeiro,
mas tenho um lobo-star no meu espelho .
[autografado]
eu foda.


aprendi a gostar de rímel.
e de mim.




belo esse horizonte que diviso
quando christiane me sorri
eu nunca estive por lá
ela nunca esteve aqui...


é dele
moacir caetano






caixinha I

procuro pelo medo
que em mim
se faz segredo

coragem,
ás vezes,
é bobagem




questionamentos pra além de distâncias

você tem cheiro de quê?



recado aos criativos profanadores da carne alheia

você que fica aí me inventando:
pára com isso,
eu já existo.


bêbada

quando te falta jeito
pra falar do meu peito
eu desinibida te malho
pra falar do seu caralho



sombra preta

olhos turvos
cílios curvos
e eu do avesso.


"minha dor.me dá a mão.
vem por aqui longe deles.
escuta querida,
escuta a marcha desta noite.
se debruça sobre os anos neste pulso.
belo,belo pulso." [Ana César]



solta teus caninos no meu corpo
enquanto prendo teus cabelos em minhas mãos
sossega teu desespero em minha boca
que eu desespero meu sossego no teu tesão




da didática do abraço ou da amizade sem tempo


é do árduo
esse trabalho de travar destinos
reencontrar meninos
ancorar desatinos,
eduardo
eduardo carrusca
cessaram-se as buscas.


querido,

algo estranho acontece por aqui.
você não acreditaria se não fosse eu a te contar: neva.
sim, neve mesmo, foquinhos frios e branquinhos
como sorvete de algodão [imagino que seja].
estamos assustados,
metereologistas e astrólogos contemporizam,
místicos e visionários arautam desgraças,
temores , fins-de-mundos.
não há flora nem fauna sustentável,
nem sóis e luas,
só um tempo cinza
e constantemente hipotérmico .
mas eu guardo uma felicidade inconfessa,
é tudo tão bonito.
é como se eu não tivesse mais sozinha,
é como se eu fosse tempo,
é como se eu me estendesse ao mundo,
é como se eu doesse menos,entende?[eu sei que sim]
a virtude disso tudo é que falta-se muito no frio
para se ter sentimentos extremamente passionais:
estou adormecida e segura aqui,
respeitando, de janelas fechadas,
a delicada ecologia de meus delírios.

[ouvindo o piano]

quem sabe você aparece, há tempo.
escrevo na semana que vem.

beijo.



o último dia de oitenta e dois anos


pow,susto,susto,susto,pow

assusto choro,
"oh meu bem,nem"
choro convulso
amor expulso
eu sem asa
eu sem casa
e de repente ele não me ama
e de repente é só ternura
me odeie então, doçura.

bares fechados no domingo
ele ante ontem me sorrindo
danação.
sinais abertos,carros espertos
eu sobrevivo do outro lado
interfones, porteiros, ponteiros
alguém me atenda
não está, não mais dá

ela está
ela fala com jeito cereja
da dureza disso tudo
"não, não, não quero cerveja"
ela me dá suco de maracujá
"ele agora onde está?"
na praça em que ele me deixou
tinha um show: vozes, violas, flautas
aquela canção...noite alta
madrugada corre e meu peito salta,
salta, salta, salta e puxa o cobertor,
grita e sopra tudo que é meu:

"lembra, lembra, lembra, lembra?"

eu lembro meu bem,
mas o que adianta
se seu amor te esqueceu?


dorme dorme que amanha tem sol enorme[eu pedi]
quem sabe você se redescobre?



solicitações tardias

peço um alma sensível
e congruente

cruel,
a minha mente.


das incoerências de um mundo

a menina-criança falava com a mãe com o pudor de quem timidamente tenta conquistar um estranho. a mae diz [han han filhinha]. a menina não entende. a mãe não sente-se.


recordações infantis


na frente do barmercearia sarico´s
o marcão, maluco da minha rua,
deitava-se seminu na calçada
e ria uma risada que eu nunca soube imitar

até hoje não entendo o escárnio da loucura
nem os barmercearias com apóstrofo-ésse


conselhos da ratoeira


“mantenha seus amigos perto de você, e seus inimigos mais perto ainda”

eu durmo comigo


o todo sem a parte não é todo,
a parte sem o todo não é parte,
mas se a parte o faz todo, sendo parte,
não se diga, que é parte, sendo todo.

gregório de matos*



gestalt


o que me contém,
com desdém me detem

o que me fragmenta
com completude me inventa

na verdade sou eu partes engarrafadas
na verdade sou eu inteireza engradada









*poema aspeado de gregório de matos "ao braço do mesmo menino jesus quando appareceo"

*trabalho de Arthur Bispo do Rosário " 20-garrafas 20-conteúdos"
:: história sem fim ::

não,não.sei, mas se talvez...eu sei,seu sei.será? mas é que eu pensei...olha, me escuta, eu acho melhor...deixa eu terminar...assim não dá.(suspiros) você viu que o tempo mudou? tsc,ah,pára...não tô mudando de assunto.tá,tá,tá bem eu sei, eu sei...então vamos começar.mas do começo. vamos começar "do começo".
náuseas
na ausência da nau
me afogo em mal estares
banho quente
chá de camomila
pão com mel

invento minha boa noite
como quem faz dobraduras


[mas e os sonhos?
sonhos são feitos de quê?
]
hoje tive conversas tortas com um menino certo
ficou tudo bem: eu canhota , ele destro.


me dá mais um pouco disso?


[experimento batons em dias nublados]



malva era a cor do céu quando eu a deixei ali.
furta cor entre lágrimas e rubor.
sem palavras, sem silêncios,
no terrível terreno dos soluços que reclamam a carne rasgada
na tentativa inútil de amenizar a dor.

ainda ela

ás vezes quem passa
é também quem espera



no amor não tenho finais felizes
Cinderela não calça 34


das proezas amorosas

guardo um amor que me excede
numa caixa de fósforos bordada.
sabe aquele cheiro bom da blusa que se sente num abraço?
pois é, é isso.
é só e é tão.
lacrimejo
bem-te-vejo
vôo triste da manhã
cinza como a rubra alma
pode ser?
pode tudo,pode escuro
pode penas e compaixões
só não pode ser tarde demais.
querido,

hoje coloquei para quarar na grama sóverde
o enxoval nosso amarelovelho.
tão bonito ele é, que só de olhar
eu te amo mais.

sonhei pela noite antiga com uma cama branca,
tão branca quanto a sua lívida testa molhada
naquele dia dentro do rio.

esse mesmo rio onde hoje, ainda antiga,
lavo minhas saudades.
o mesmo rio que me salva em alvuras
ou que eu salvo, sustentado que é pelas minhas dores.

mas hoje tenho o rosto seco
e nele um sorriso firme
que se esgueira entre os varais de vento.

se você pudesse ver...
querido,

santa está louca e me atormenta.
pra você ver, olha, ela disse que eu não devia te esperar
e aceitar os cuidados do albinossombra lúcio.
disse até da sua morte.
vê se pode?
vê.

fiz como você pediu
- recado no balançar do bambuzal, eu li-
"não dei confiança"

tenho tanto medo da loucura,
quase o mesmo medo que tenho em te perder.
medo das coisas roxas.
doidivez e feridas abertaseternas são dessa cor.
medo das coisas que a gente só sente, sente, sente,
sente quase morrendo,mas nunca entende.

eu continuo sentindo.saudades no caso.no nosso.
sentindo e te esperando.

volte logo ou quando puder.
beijo,
sua mulher.
Hoje saí de casa meio hindú.
Saí com olheiras fundas,
olhares-mistério,
calça que desenha bordados em meu corpo esquálido.
Saí com bangalôs pendurados no pescoço,
com partes do "Bhagavad-Gita" a ilustrar meus textos, em janelas de metrô.
Saí adorando uma vaca chamada Hilda.
Hilda Hilst.
Hoje, sem o meu nome cristão, tive mil deuses hindus
a entoar mantras pro meu dia,
já que deuses existem nos sons
mas não há deuses em palavras sânscritas.
Precisei de epifanias hoje.
Não tive plurais, mas tive uma inteira.
desapegos diários
é o exercício da boa morte.
possessiva de nadas que sou,
vivo mal,
mas tenho alternativa:
dias contados
e entregas voluntárias.

tudo, menos nada.
hoje eu estive com o diabo
e ele me contou ótimas piadas.

taciturna, como diriamos, nem fui mais.

pra despedir uma reza:
segue forte que é boa a sorte.

achei isso simpático.
querido,

hoje palavras na antiga catapulta
acertam em cheio as coisas do meu dia.
meu nariz continua sangrando,
reagindo á saudade,
ao mundo seco sem as minhas umidades condicionais.
eu levanto a cabeça e maculo alvuras
no magenta próprio de mim.
neste calor que amortece qualquer sentir
nebulosidades eu queria.
até tentei neblinas ontem á noite,
mas você,
bem sabe [tsc,tsc],
concreto que é não permite.

aguardo novas previsões.
uma carta sua.
ou uma encomenda sem remetentes.

[mande lenços]
á meia luz

de súbito
um beijo
suspenso
penso
suspeito de
um jeito
seu peito
minhas queixas
seu queixo
me mexo
eu?
...deixo.
acácias noturnas
colunas
compasso

secreta,
maçono silenciosamente
um céu de estrelas ímpares,
orfãs de contelações,
onde eu possa
me maternalizar.
chuva de primavera -
uma menina ensina
o gato a dançar

issa kobayashi


o amor impregnou três frases
numa fotografia repartida.

eu colo.
sonhos abrem pálpebras:
janelas invertebras,
onde futuros contorços
se esgueiram no para-peito.

[para corpos
para-quedas ciliares
que anti-paralisam
a aspereza de voar]
terceira cena de um filme triste

desabores
desamores
descolores

amargo de dores
em preto e branco
num filme antigo
que ninguém mais vê.

por que então não deixa de doer?
glitter

sapatos de boneca
para uma menina mulher.
dissimulada,
o que mais que ela quer?

chamam isso de
"introdução á experiência inefável da natureza do Buda".
já o meu vazio, eu chamo de vazio mesmo.

[o nirvana não me engana]



citações de situações:

["Como todos os homens eu sou o meu pior inimigo. Como muitos poucos homens, porém, também sei que sou a minha única salvação"] *

aleluias não são libélulas.


*Henry Miller
das (in) condições do amor

apelo ao elo
de peles e pêlos:
atropelos
para marcela


numa sexta pode ser que nada aconteça.
será?
enquanto espera respostas noturnas,
ela joga paciência
...
...
...
e troca o transparente toque de uma camisola rente
pelo charuto denso em baforada quente.

"esperanceie, nada é tão improvável" - disse o charuto.
geniosa que é,
ela queima lâmpadas
e desrealiza desejos.
escura e sozinha.
oniriscências

dos sonhos de ontem lembrei
do pão de queijo na toalha xadrez,
da crítica de um enclausurado,
de um chopp escuro,
de uma reconciliação.

emendo sonhos vários num não piscar de olhos.


masmorra 24

eu turvo,
algo treva.
eu rondo sombras,
sobras,
celas.
sondo as velas.
escura a especular o claro
de forma íntima,
imersa,
inversa,
aversa a estrelas.

para júnia

com libélulas nos lóbulos,
lá vai ela linda.
toda vaidosa.
aos improváveis


se não sou assim,
não me desculpo.
nem sinto muito.
tenho palavras bem alinhadas numa língua certa-
isso,a príncipio,reis e reinos tais, me basta.
me basta e me sobra em gestos extensos e inquietações idem.
nada mal
sei de rancores, de amores, paixões e amizades
e não me endureço (certeza) ,
nem me amoleço (destreza) com elas.
transito sem aquela volubilidade,repito:
sei de mim.
isso por que os flexíveis me atormentam
a despeito de qualquer exigência e bom tom.
bom tom?
bom tom é o caralho,
e caralho é luxo.
é provável
já aí não sinto muito,
vão falar eu sei, mas não sinto.
defina
defina e me coloque á disposição,
distração dos bem trajados em personalidades convencionais.
boderlines?
estranheza dividida com os PMD´s
compartilhadas em salas de anônimas
histórias que se declaram ás paredes surdas.
rudes e egoístas nada escutam,
apenas o barulho da fumaça de cigarro
a despir pulmões encarcerados.
e os cúmplices...oh putz, tenho clãs, sim os tenho.
egoístas anônimos
a trazer a marca na fronte:
expressões que me delineia várias.
anônima?
travo meu nome em cada esporro,
em cada certeza insistida,
em cada exigência de despropósito.
que importa o quê e o por quê de quando num onde talvez?
travo línguas em sentidos duros e nem me atropelo,
me persigo, mas vocês? não admito.
admoestada não.
eu denuncio.
tantas negativas me denunciam eu sei.
mas qual o preço que se paga?
eu?
comigo eu pago.
só pra ver, voyer, a face extensão minha,
a perpetuar estranhezas inerentes
tão rechaçadas convencionalmente.
não dou mais bom dia e a noite a mim não se dá
brocha de tudo,

eu sei.
anja

que fazes que andas tão cansada?

aborrecida, os dias te aborrecem
com suas pedrinhas, e ainda nem
podes dar a rufada da semana.
compromissos, contas e tentativas
de pegar a promoção do supermercado.
no quarto branco, os gatos sentem saudade,
mas és muito atenciosa para que sintam falta.
espreguiça-te com força
e afugenta um pouco o sono.
faz tua bondade com cara de malícia de hoje
e dorme- sonha porque amanhã é outro dia
que tentarão te tomar as asas.
é outro dia para pregares peça a quem tenta.

por Marcio Yonamine em Parachutes.01
christalina

"será feliz enquanto não enxergar a própria imagem"
águas do rio,
eu idem,
estou de passagem.


dos acontecimentos púrpura

escreveu ela ao tio
a expressão fidedigna
de suas inéditas emoções.
ela com as mãos impotentes
e o peso do ranger dos dentes
cuidando das novas dores nascentes
vestido cinza

moça triste quando passa,
rosas rubras despedaça.
apaga estrelas com seu olhar nublado.

moça triste quando passa
alegrias ela afasta
tomba sobre si ombros curvados.

moça triste quando passa,
já sem graça,
só reclama um coração.
ele faz anos
e eu não faço nada.
sem felicitações tolas,
sem parabéns
e gestos além
do que se pode mover.
são os silêncios necessários
para que na distância
continue o sem-tempo.
e como eu vivo disso...
de carpe-diens guardados
em ampuletas viciadas.
todos os dias a mesma prisão.
então,
não é do sem coração,
sem memória
ou similar.
é do intuido,
resguardado,
do relevado,
revelando e
e extirpando temporalidades
que sequer importam.
o que importa é o retrato
bem desenhado do quarto,
que eu fiz onipresente
pra quando eu precisar lembrar.

nuvens,
desamparada arrisco um passo.
vento,
levanto os olhos já sem alento.

corajosa eu me dou em corpo-porta-chuva.
que perigo me cerca além daquele que carrego?

ternura em pingo grosso, descubro.
delicadeza contida num arroubo de lágrima.
por chora?


tempestades então, eu nublada consolo.
segredo I

meus versos brancos dormem inconfessos na sua mochila amarela



e você nem mais se lembra.
e eu quase esqueço.

procrastinações tanatológicas

tem dias que pedem morte.
eu morta peço dias.
só alguns dias
pra decidir uma tal eternidade.

hades dorme
e eu me deixo ás erínias.
entre e escuros e musgos de uma árvore matutina

não mastigue o que me dói
- suspirou honestamente a menina nascente.
tão inédita, mas já conhecedora dos passos antevistos.
sabe do clitóris antes mesmo de nascer,
sabe de estrelas antes mesmo de morrer.
sabe, sabe, mas manipula esquecimentos.
ela fenece todos os dias, como as borboletas suicidas.
mas quem é que não pisa em vidros?
quem antevê- respondeu um presente de pedra,
que não foi com as águas
e nem irá com o vento:
uma pedra presente que nunca sangrou seus pés,
pois sabe que "uma pedra só não voa
por que não quer
e não porque não tem asas"*** como as borboletas suicidas.
a menina ouviu,
fechou o livro do leminski
e escreveu numa folha solta & branca:

ossos quebrados
do parto recente
depois do choro,
a gargalhada.

e gargalhou.

citação:
*** paulo leminski

póstuma semana

fogem palavras,
fogem dias,
fogem de mim,
de minhas agressividades tontas,
de meu mau humor ou seja lá o que for.
eu descontrol ,
ácida como em poucas vezes ,
marco com meus dentes
a carne de inocentes.
lambo com lingua afiada
os vermes complascentes.
satã, belzebu, exu-caveira fazem a festa,
enquanto são jorge tira férias em marte.

e eu vivo meus dias de lua:
dias sim ,
dias não ,
dias talvez ,
dia a dia rotina hell ,
dias de retinas help.
no refrão da vida que me dá tédio ,
esgoto meus vocabulários chulos ,
diretas felinas, mordidas caninas.
atrás do eutanásico repouso, durmo.



vasculho a memória insistente
atrás de letras, tatoos e veias salientes,
de olhares do olhar pequeno,
de delicadezas do sentir ameno.
vasculando outros olhares,
invisto avatares e
novas palavras a cobrir
livros brancos:
ele sabe do meu alfabeto,
esse mesmo que não existe,
enquanto invento verbos e estados pra ser.

eu curiosio enquanto convenciono: o amo.
subentendidos em cantis vazios

(ou como usar roupas com bolsos fundos ou a lenda-fenda-cardíada da separatista basca ou o que se vai no coração de um amor-abandonado?)


caminhando calados.
horas de tréguas,
punhais afiados.
oscilam por léguas,
inimigos ou aliados?
aos interessados

hoje,sozinha,
tive frio vespertino,
cachecol e capuccino

hoje eu até usei batom
ao pequeno dragão-estrela, rei inocente dos meus nagas


meu dragão não dorme nunca
quando eu atenciosa me atraio
ele fecha os olhos e finge


o meu dragão me comeu.
incompreensivo,tostou percepções
me condenando vigílias constantes


o meu dragão me psicotiza em cobranças
exigências e manhas quentes
me presenteia sorrateiro com olhos móbiles
a distrair minhas outras ocupações


mas o meu dragão é inocente
de olhos abertos e respiração fenecente
espera infantil pelas borboletas


o meu dragão eu entendo
nada adianta
o meu dragão chora, incongruente, no escuro
medroso de claridades
e da solidão a qual as vezes me abandono


o meu dragão,
num átimo-ato-falho não mais entendo;
sinto em rasteiras verbais.


o meu dragão...sou eu.



Feliz 456 anos


a psicologia nunca dirá a verdade a cerca da loucura,
pois é a loucura que enuncia a verdade da psicologia
Foucault


marcílio,

essa vida não tem cura
o seu pau tem razão
você tem é loucura
mas o azar nem é o seu
o azar é de quem jogou no bicho errado.
não se joga pedra na geni assim.
ri, ri de mim gosto mesmo que ria.
e a gente acha engraçado , né.
talvez eu largue essa vida,
desapropria marte aí pra mim já que saturno já é seu.
queria marte mas sem esse seu martírio
que paga a sua eternidade,
o seu pau,
o seu crime e
o seu gozo.
não sei escrever no ar os tais recados de deus.
me dá um pedaço de céu pra eu treinar essa tal caligrafia,
me dá as vozes,
me dá a escrita e a língua,
a língua amarela de guimba mascada,
abre a mão, me dá.
mas eu não sirvo, eu sei.
tão suja e inóspita de fé,
tão imbuída de nadas e anti- afins,
tão irresponsáveis com dívidas,
alugueis e condomínios
dos mundos inabitados deste teu deus.
inimigos teus não são só compêndidos psiquiátricos,
são os meninos do pau-rei
que falicamente te ordenam a pagar com anos ,
com anus,
com invasões corpóreas e domiciliares,
a quebrar espelhos de banheiros e convicções minhas.
você , vários, me escolhe.
e só um você tira fotos de mim, assim.
"que merda você acha que é?"
"discípula do cú é sim"
"vivo isso a 50 anos"
"quer saber mais de mins?"
"jogar dama não é pra cavalheiros"
"hoje eles mandaram eu mentir pra você, mas você não vai contar"
"eu não sou normal"
"desconfio que você não seja normal"
"não deixa eu te machucar"
"compra um filme pra mim"
"não é como sempre, como as outras"
e tira uma foto minha,
conceitual como você diz,
mas não de "vigília" que eu não sou assim.
me diagnostica: " verbete: não é como os outros"
clarão de verdade, quem falou em razão?
hoje eu sei que fazer de tridentes de incompreensões
e fotos pollaroides.
eu vejo deus nas linhas aéreas.
leio daquele jeito, lembra?
então lê o cartão de aniversário que escrevi pra sempre.


tenho uma foto minha chamada de amizade, uma amizade chamada marcílio, uma aposta ganha(rá), e um maço de cigarros novinho que não mais escondo dele.